Muito se tem discutido,
ultimamente, acerca dos chamados “rolezinhos”, que são os encontros de
milhares de jovens em “shopping centers” para, segundo eles, “curtirem”,
“paquerarem” e “passearem”.
Antes de adentrar ao mérito da
questão, cabe ressaltar aqui que não somos contra o direito de ir e vir das
pessoas, seja de qual classe social for. É direito fundamental dos mais
importantes, e não pode ser negado. Mas também não pode ser tolerado ou considerado
correto o “direito de reunião” de centenas ou milhares de pessoas em
espaços eminentemente privados e sem estrutura para tanto, como é o caso dos
centros de compras fechados.
Abre-se parênteses para se destacar que os shoppings são,
sim, estabelecimentos privados. O fato de serem espaços abertos ao público não
implica em comprometimento dessa natureza. Os centros comerciais poderiam, a
exemplo do que acontece em boates e congêneres, revistar as pessoas para
impedir o acesso aos portadores de arma de fogo. Não fazem apenas por questão prática ou de conveniência, ou mesmo
para não desestimular o consumo e os freqüentadores.
Vale também ressaltar que os
ambientes dos centros comerciais hoje são freqüentados por todas as classes
sociais. Assim, resta dizer que não passa de falácia o fato de que há
discriminação ou mesmo um “apartheid social” no Brasil. Existe uma convivência étnica pacífica, com brancos, pardos e negros em todas as classes sociais, diferente da realidade africana, por exemplo. O que há aqui, e em
qualquer lugar do mundo da linhagem dita “capitalista”, é uma “seletividade”
econômica, própria desse modo de produção. Nessa linha de raciocínio, temos
que só os ricos freqüentam os restaurantes ou boates caríssimas, por exemplo. E
fica a pergunta: incorrem em discriminação esses estabelecimentos? Não. É um
legítimo direito do ofertante (ou comerciante) querer atingir uma determinada
faixa econômica através de estabelecimento privado. Isso se chama “livre
iniciativa” e é salutar, importante para o desenvolvimento do país. Isso é
capitalismo. Para o vácuo social, ou distância existente entre as classes sociais, resta ao governo melhorar a qualidade do ensino público, de modo a permitir iguais oportunidades - a partir dessa premissa, os melhores certamente se sobressairão, conseguindo os melhores empregos e auferindo maiores rendas.
Voltando à questão do direito de
reunião, vamos às ponderações sobre o porquê da nossa opinião contrária à prática
de “rolezinhos” em shopping centers.
A uma, porque toda reunião com
aglomeração grande de pessoas representa, em tese, um aumento da insegurança
do local para as outras pessoas não participantes do encontro. Como
aconteceu nos protestos durante a Copa das Confederações em 2013, muitos
“participantes” irão para tais reuniões com “segundas intenções” ou mesmo para
se aproveitar da situação, a exemplo de saques, furtos, estímulo à correria,
depredações. É difícil prever o comportamento das pessoas aglutinadas em
milhares, ainda mais em um espaço fechado. Em Belo Horizonte, no ano de 2013,
noticiou-se exaustivamente nas rádios da capital um “rolezinho” no Shopping Del
Rey, cujo único objetivo era demonstrar o poderio de uma turma de um bairro
sobre outra, numa autêntica briga de gangues. Várias lojas, diante do caos e da
correria, tiveram que baixar suas portas para evitar o pior. Sempre ocorre
isso? Não sei. Mas pode acontecer. E essa incerteza já é suficiente para que o
centro de compras tenha que tomar providências para se evitar o pior.
A duas, porque a finalidade do
espaço comercial é privada, qual seja, o comércio de produtos e serviços.
Dentro da normalidade, com a livre circulação das pessoas em pequenos
grupos ou famílias, é possível, e até aconselhável, divertir-se em
shoppings como, por exemplo, ir ao cinema, almoçar em um restaurante, etc. Mas
marcar uma reunião de mil, duas mil pessoas nesses locais não se revela
adequado, pelas razões de segurança já elencadas acima. Aliás, é bom que se
diga, toda reunião em espaço público, a exemplo de praças e avenidas, deve ser
previamente comunicada à autoridade competente, para as devidas providências
decorrentes da utilização do local (segurança, trânsito, etc).
Em terceiro lugar, devemos estar
atentos ao fato de que os direitos fundamentais não são absolutos.
Assim, ao direito de reunião dos “rolezistas” em ambiente privado fechado contrapõe-se
o direito de ir e vir das outras pessoas, o direito à segurança, o direito ao
lazer, à vida, o direito de propriedade, o direito à livre iniciativa e o
direito ao trabalho das pessoas que ali estão. Em um ambiente privado,
estritamente comercial, devem prevalecer os últimos citados. Entrar no centro
comercial, sim. Passear, sim. Comprar, também. Ir ao cinema, recomendável. Mas
fazer reunião de centenas ou milhares de pessoas em um ambiente privado, não.
Assim, a marcação de reuniões em
centros comerciais privados fechados me soa inadequado. Ao Shopping, afastada a hipótese
de “seletividade” na porta do estabelecimento, por estar contrária a direitos
fundamentais e ser de difícil colocação prática, resta cerrar as portas nos
horários de encontro marcados nas redes sociais para se evitar o tumulto e o
risco à segurança dos freqüentadores do espaço. Por outro lado, caso não
fique claro a data correta dos encontros, cabe ao shopping, através dos
seguranças do local, monitorar a aglomeração que se formará e tomar
providências no sentido de dissipá-la o quanto antes. São medidas de
segurança que não afetam em nada direitos individuais e buscam a preservação da
convivência harmônica em sociedade.
Tais decisões do estabelecimento comercial não seriam “discriminatórias”
nem tampouco arbitrárias. São decisões privadas, do dono do estabelecimento,
que não se resolvem, e nem devem ser resolvidas, no âmbito dos Tribunais.
Aliás, medidas judiciais são até inadequadas por não haver, nesses
“rolezinhos”, um líder declarado ou que possa responder pelos atos ilícitos
eventualmente praticados. É uma massa sem rosto definido ou sem um rosto que
possa ser responsabilizado, seja civilmente, seja penalmente. O shopping, desse
modo, deve ter uma atitude ativa de enfrentamento da prática (cerrando portas
ou dissipando multidões, como já ressaltado) e passiva no que tange aos
Tribunais, sem incorrer em abusos e práticas contrárias ao ordenamento
jurídico.
Antes de tudo, o bom senso deve
prevalecer, de modo a desestimular a prática que em nada contribui para o
desenvolvimento social de nosso país. Comportamentos civilizados e educados devem ser a regra em uma sociedade que quer evoluir.
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